Clara Rojas: «O sequestro colocou minha fé à prova em todos os níveis». A ex-companheira de Ingrid Betancourt assegura que está viva graças à fé
A esperança, o perdão e o respeito à vida foram virtudes fundamentais que Clara Rojas lutou por manter durante os seis anos em que esteve sequestrada na selva colombiana. Ela assegura que a fé, incutida por seus pais e as irmãs da comunidade de Cristo Rei, no colégio onde estudou em Bogotá, constituiu uma base sólida para que em seu cativeiro pudesse cultivar estas virtudes.
A advogada colombiana, de 45 anos, sequestrada junto com Ingrid Betancourt em 23 de fevereiro de 2002 e libertada em 10 de janeiro do ano passado, visitou Roma junto com sua mãe, Clara González de Rojas, e seu filho, Emmanuel. Na quarta-feira, 11 de março, os três estiveram presentes na audiência geral com o Papa Bento XVI.
Em seu cativeiro, como ela confessa, sua fé foi provada: quando se inteirava do assassinato de outros compatriotas seus que estavam sequestrados como ela, ou quando em meio a seu cativeiro nasceu seu filho Emmanuel, de quem esteve separada durante três anos.
Em diálogo exclusivo com Zenit, Clara compartilhou a experiência da fé em meio à incerteza total.
– Quando você estava sequestrada, por que optou pelo caminho da fé?
– Clara Rojas: No sequestro, quando se está sozinho, restam somente as portas de Deus. Eu me lembrei das bases católicas que tive e das que pude alcançar. O sequestro me permitiu fortalecer minha fé em Deus e a pôs à prova em todos os níveis. Tive muitas oportunidades de refletir, muitos momentos de paz e de tranquilidade, e isso me permitiu orar, pedir a meu Deus. E creio que as orações tiveram eco e chegaram a algum lugar; e finalmente, graças a isso, foi possível o milagre de encontrar a liberdade e de encontrar-me com meu filho.Às vezes tinha sonhos que não se consegue entender e com o passar do tempo vou compreendendo. Eram como uma voz que me dizia que tivesse calma e que esperasse. Nos últimos três ou quatro meses, antes de que me libertassem, senti como se me tivessem dado a entender que primeiro ia sair livre e depois que ia encontrar meu filho. Isso para mim foi fundamental. É como se tivesse entrado em uma paz sem saber o que ia acontecer, mas com a certeza de que tudo estaria bem. Aceitei que a libertação poderia ser uma possibilidade.
Depois de tanto rezar, recebi bem a notícia da libertação e não me surpreendeu, o dei por feito. Preparei meu equipamento, ainda que não tinha muitas coisas. Deixei umas coisas que já não me serviam e viajei com o mínimo.
Alguns dos que estavam comigo não acreditavam e me diziam: «os guerrilheiros nem sequer lhe confirmaram que vão libertar você». Mas eu no fundo sabia que sim. E era por minha fé em Deus e em Nossa Senhora.
– Algumas pessoas na Colômbia criticaram o facto de que tanto a Clara como Ingrid tenham recorrido à fé no sequestro. Achas que é uma fuga ou é realmente um meio para fortalecer a esperança?
– Clara Rojas: Eu respeito muito as opiniões das pessoas; talvez seja porque eles não viveram uma situação limite, como em meu caso particular. Quando não se tem nada nem ninguém que lhe possa dar um apoio, e quando se tem a educação cristã como eu a tive, a única coisa que tem que fazer é estender a mão ao Deus Todo-Poderoso e aferrar-se a isso para poder buscar uma luz, porque são momentos nos quais se vê total escuridão, não sabe se vão libertar você, não sabe se vão lhe matar, e também você está sozinho. Tem que se agarrar em alguém para poder sobreviver. Ninguém sabe em carne própria o que isso significa. Para mim, o sequestro constituiu uma oportunidade de afiançar minha fé e agradeço a Deus por isso, porque graças a essa fé eu me mantive viva. Se eu não tivesse pensado que existia Deus, que havia uma esperança, e que sempre havia uma possibilidade de encontrar minha liberdade, teria desfalecido no primeiro momento. Tive esperança graças a que pude ler a Bíblia em sua integridade, graças a que pude orar, graças a que pude sonhar. Recebi muitas mensagens de pessoas que diziam que estavam rezando por mim e pela libertação de meu filho, que me permitiram saber que a liberdade podia ser uma realidade.
Sinto-me feliz de saber que graças à fé estou viva. Isso compartilho com as pessoas sobretudo nesta época em que aparentemente ninguém crê em nada.
Eu lhes digo que a fé é uma força muito importante; não se vê, mas move montanhas.
Vou contar-lhe algo que vivi enquanto estava sequestrada: às vezes cantava a Nossa Senhora canções que havia aprendido quando criança e um dia me trouxeram a comida e um dos guerrilheiros me perguntou: «para canta quem você?» E eu disse: «Para Deus e para Nossa Senhora; estou lhe agradecendo por estar viva e porque posso comer». O guerrilheiro me respondeu: «Clara, mas, você crê que se Deus existisse você estaria onde está?». Eu lhe disse: «Deus é um pai. É como quando eu ia ao cinema e lhe dizia: ‘dá-me dinheiro para ir ao cinema’. Eu estou pedindo a Deus que me dê a fortaleza para encontrar a liberdade. É alguém que pode nos dar um apoio quando cremos que isso é impossível».
– Com relação ao seu filho Emmanuel, que nasceu em meio ao sequestro: se uma mulher se encontrasse na mesma situação e quisesse abortar, o que lhe dirias?
– Clara Rojas: Respeitando muito as decisões das outras pessoas, creio que se tem que fazer todo o esforço para salvar a vida, porque as mulheres estão feitas para dar vida. Eu convido as mulheres a que, em qualquer circunstância na qual estejam, por mais difíceis que sejam, se veem a possibilidade de salvar a vida, que perseverem em conservá-la. Nesse momento ninguém apostava nem em minha vida nem na vida de Emmanuel, mas eu digo que foi a mão de Deus que nos acompanhou e, por mais difícil que tenha sido, Ele nos deu a oportunidade de estar vivos e de reunir-nos novamente. Lendo a Bíblia, descobri que Emmanuel quer dizer «Deus conosco» e quando estava grávida pensei: «meu filho tem que se chamar Emmanuel porque ele é uma bênção». Isso é o que significa meu filho em minha vida, «Deus conosco». Agora creio que, se alguém se preocupa por conservar a vida, Deus se encarrega do resto.
– Acreditas que a fé lhe ajudou a perdoar a quem a sequestrou e a quem a separou de seu filho?
– Clara Rojas: Claro que sim. Agora estou escrevendo um livro sobre minha experiência no sequestro. Neste desenvolvo o tema do perdão e me pergunto: «onde me ensinaram a importância de perdoar?». E penso que isso vem da fé. O perdão é importante não só para as pessoas que fazem o mal e que você perdoa, mas para você mesmo. Desta forma não se tem uma carga tão pesada de ressentimento e de ódio. O perdão é um ato libertador que te permite viver a vida e encontrar o sentido da liberdade de maneira mais tranquila e livre. Em meu livro, procuro contar minha história, meu sentimento e meu pensamento. O que sofri, o que padeci, o que tive de enfrentar. Falo de como sobrevivi e do que me permitiu passar seis anos sem liberdade. Em grande parte foi a vontade de Deus que me deu a fortaleza para poder me manter viva e encontrar a liberdade. Em parte. é contar a história por etapas e o mais importante é o reencontro com a liberdade.
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